sábado, outubro 07, 2006

(Meiri)

Os lençóis negros da noite desciam, tombavam, adormeciam colados uns aos outros, como folhas que se voltam juntar.
Depois de várias voltas por N ruas da cidade pareceu-me que era por aquelas bandas que a festa começava a fervilhar. Num passeio de uma rua desamparada, encontrei um banco á minha espera e pedi mesmo ali á Sr.ª da rolote uma cerveja bem gelada. Recostei-me, costas com parede e vice-versa, e pus-me a pastar vacarosamente o olhar á volta. Havia de tudo o que era gente, jovens em grupos soltos e felizmente assim, pessoas solitárias, alguns com ar de quem procura desespiradamente libertarem-se daquilo, outros já mais ancorados, havia casais apaixonados que nem pássaros azurumbados, havia também mulheres de todas as cores, e as mais belas prendiam-me o olhar por mais tempo e depois, desapareciam pelas portas dos bares de onde soltavam canções ás molhadas, e de quando em quando muitas vezes, tudo aquilo junto dava-me sede para outra cerveja.
Por cima de mim, a escuridão salpicada de estrelas e uma clara sensação de vastidão completamente alheada.
A incerta altura, uma menina sozinha, por dentro e por fora, aproximou-se de mim, de cerveja na mão e sentou-se a meu lado. Depois continuou calada, ancorada e eu também não de cerveja na mão. Encostou a sua tristeza desarmada no meu ombro abrigada e eu comecei a falar. As minhas palavras eram peixes criados ali, para o seu mar. Sem darmos por isso, pusemos os olhos nos olhos e começámo-nos a beijar. O seu fundo sereno tinha outro olhar. E uma paixão apareceu naquele lugar. Claro que o dia nasceu sem nos avisar.



Gaia.27-05-2006
( Fortaleza.Brasil.2003.)

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